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O “Brazilian way” de empreender: cultura empreendedora no Brasil vs Estados Unidos

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Minha experiência trabalhando em um VC americano esse ano, como parte do YLAI, um programa de intercâmbio de empreendedores do governo americano, me fez perceber com clareza as diferenças entre os perfis de empreendedores brasileiros e americanos. São mudanças significativas e têm profundas implicações para o desenvolvimento de novas tecnologias, e impactam bastante a forma como o ecossistema de inovação evolui em cada um desses países.

Nos Estados Unidos, vi uma tradição enraizada no desenvolvimento de tecnologia e aplicação de novas soluções. Afinal, foi lá que surgiram inovações como a internet, a inteligência artificial (IA) e o smartphone. Essa história de sucessos cria um ambiente favorável para a inovação, trazendo um volume maior de investimento e pessoas dedicadas à criação de tecnologias disruptivas e de base, como IA pura ou engenharia genética avançada. A concentração desses talentos nos EUA atrai mentes brilhantes de todo o mundo, o que cria um ciclo virtuoso de inovação e impulsionamento.

Por outro lado, o volume de investimento e concentração de talentos necessários para empurrar as fronteiras da tecnologia faz com que outros mercados, como o brasileiro, tenham dificuldade em competir nesse mesmo nível. O que vemos aqui são iniciativas que muitas vezes se concentram em adaptar ou aplicar tecnologias já existentes, em vez de desenvolver inovações do zero. Isso não é uma crítica, mas uma constatação das diferenças de ambiente e oportunidade. A nossa vocação, como mercado emergente, está na aplicação de soluções na nossa base de consumidores ávidos por novidades, com potencial de crescimento rápido.

Outro ponto que distingue os empreendedores americanos dos brasileiros é a relação com o fracasso. Nos Estados Unidos, o fracasso é visto quase como um rito de passagem. Os empreendedores falham com mais frequência e de maneira muito mais rápida. Isso pode parecer, à primeira vista, um indicador negativo, mas na verdade é um motor de inovação.

A falência rápida permite que os empreendedores aprendam, pivotem e comecem algo novo com maior agilidade. É comum encontrar empreendedores que, em dez anos, fundaram três ou quatro negócios que falharam antes de finalmente criarem um unicórnio. Esse ciclo rápido de tentativa e erro é essencial para o avanço.

No Brasil, a realidade é bem diferente. O fracasso empresarial aqui tem consequências mais pesadas, em alguns casos afetando severamente a vida pessoal do empreendedor. Isso cria um ambiente onde é mais comum ver negócios sendo sustentados por longos períodos, mesmo quando não estão dando os resultados esperados. Há uma maior resistência a pivotar ou mudar de rumo, em parte devido ao medo das repercussões sociais e reais do fracasso. Nossa dificuldade em lidar com o fracasso acaba por retardar o ritmo de inovação no país.

O capital disponível também é um fator chave. Nos EUA, com um Produto Interno Bruto (PIB) estimado em US$ 26,95 trilhões, o acesso a capital é muito mais abundante. Isso cria um ciclo virtuoso: empreendedores e investidores que obtêm sucesso acabam reinvestindo no ecossistema, seja por meio de investimento-anjo ou através de grandes fundos de pensão que apostam em empresas de tecnologia.

Um exemplo interessante é o da Nvidia: uma pesquisa realizada em junho deste ano com mais de 3 mil funcionários da empresa (de um total de cerca de 30 mil), indicou que 76% deles afirmaram ser milionários. Sendo que um em cada três funcionários tinha um patrimônio líquido superior a 20 milhões de dólares (algo próximo a 112 milhões de reais). Isso foi possível graças a um programa de compra de ações da Nvidia, que permite aos funcionários adquirirem papéis com desconto de 15%. Quando as grandes empresas oferecem essa possibilidade, esse capital volta ao mercado em forma de novos investimentos, alimentando ainda mais a inovação.

Com mais capital disponível, os americanos têm um apetite maior por risco, o que acelera o ciclo de inovação. Empresas quebram mais rápido, mas a evolução também acontece com mais velocidade. No Brasil, por outro lado, o capital é mais escasso, o que diminui a disposição para correr riscos e limita o crescimento de muitas startups, principalmente em fase de tração.

O “Venture Capital – Master Guide”, produzido pela ACE Ventures em conjunto com o SoftBank e a Emerging VC Fellows, mostrou que no último ano o mercado de startups early stage no Brasil recebeu US$ 4 bilhões em investimentos, enquanto os Estados Unidos somaram US$ 245 bilhões no mesmo período.

Essas diferenças estruturais são profundas e afetam a maneira como os ecossistemas de startups se desenvolvem em cada país. Nos Estados Unidos, a abundância de capital, o histórico tecnológico e a cultura que abraça o fracasso criam um ambiente fértil para inovação disruptiva. No Brasil, temos desafios adicionais, mas também oportunidades únicas de adaptação e crescimento, que exigem resiliência e criatividade por parte dos empreendedores.